quarta-feira, 4 de abril de 2012

O EVANGÉIO SEGUNDO O HOMI DO SERTÃO

Xilogravura: Luiz Natividade



Certo dia, Deus óia aqui pra baixo e diz:
 Oxente! Esse povo tá ficano doido é?!
Criei a terra, o céu e o mar
As pranta e os animá
E eles – homi e muié
Mas tá um no prato do ôtro meteno a cuié,
Tão se acabano, acabano o praneta, moço
E ói que no iniço tudo era bão, desde esboço!

As injustiça tá arretada
Os homi só qué dominá
Os seres que se dize humano
Qué é mermo enfiá a faca no buxo do ôtro


Como se diz entre eles mermo
“Farinha poca meu pirão primêro”
É tanta gente desumana precisano se consertar...
Já tô veno, vô tê que mostrá pra esse povo
A agir como gente mermo...

Jesus, meu fio, venha cá!
Oia pro desgracero que tá se assucedeno lá imbaxo
Minhas criatura prefirida meu fi!
Essa gente tem é sorte, vice
Pro mode num fosse meu amô pro eles
Que é maió que seus pecado
Tarium tudo arruinado, f
ritim, fritim:
Todo mundo lascado.

— Não se apoquente meu pai
A gente já vai arrersorvê esse causo
Num vai ser farci não
O cálice é pesado
O que se tem nele é amargo
Mas há o que se fazê.

— Tá bom meu fio
Entonce tu vá lá
Pra lá eu te enviu
Pra a esse povo anunciar
A justiça e a igualdade
Purque a iniquidade
Já num tá mais pra se guentá.

Num é que Jesus foi mermo, homi?!
Desceu em forma de gente
Num ventre de uma tá de Maria
Lá de Belém da Judeia
Muié valoroza e de fé
Que sofreu restrição sociá da comunidade
E até mermo de seu marido José
Que num entendeu nadica de nada
Da gravidez inesperada
Mas o Sinhô mandô um anjo
Pro mode de falá cum ele, através dum sonho
Expricando o acontecido
E só depois disso entonce
Que ficô tudo esclarecido.

Após perseguição
E também muita aflição
Teve o menino que nascê
Num dormitório de jegue
Numa tá de manjedora lá
No meio de capim e de animá
Pro mode de não ter dindim
Pois num era de famia de posse
Êta situação ruim...

Mas tudo acabô-se dano certo
Essa criança foi cresceno, cresceno...
Em artura, matutez e graça
Diante dos homi e de Deus.

Aos trinta ano foi batizado
Prum tá de João Batista, seu primo
Que vivia no deserto
Comeno uns garfanhoto e mé sirvestre
Pregano arrependimento
Às vríbura da época
Escribas e farizeus:
Ô raça de cabra safado!
Pouca atitude e muita conversa
Melhores são até os ateu.
Mas deixa isso pra outro mote de prosa
Vamo dá continuidade ao causo em pauta.

Pois entonce, logo depois desse batismo
Nosso sinhô contemprô o Espríto Santo!
Que veio sobre ele e disse:
“Esse é meu fio amado
Em que tenho um prazê danado!”
E aí sim o nosso Sinhô começô seu ministero
Que foi grande de arruiná
As estrutura sociá da época.
É que ele começô a curá
Libertá, ensiná, restaurá.
Aos rico pregô pobreza de espríto
E aos pobre abraçô com riqueza de amô.

Mas um tá de Judas, um dos seu dircípro
Quis colocá tudo a perdê
Mas não ficô Jesus a se emburrecê
Já sabia de tudo a ser vindo
Tava inscrito lá,nos prano divino.

Desde aí nosso mestre foi cuspido
Deram com um caniço em sua cabeça
Puseram nele um pano avermeiado
E uma coroa cheia de espinho.
Fizeram gozação com ele
O chamano com muito sarro
De “Rei dos Judeus”.

Colocarum num madeiro
O prego lhe fez muita dô
Os espinho lhe aprofundava o coro cabeludo
E ele, sufocado, agonizô.

Mas nosso Sinhô num desistiu não
Tava por demais arrersovido
Prosseguiu, firme prumo foi mantido
Até o fim finá ficô.

É... aquela cruz
Era que nem mandacaru
Dolorida e espinhosa
Mas de onde saia líquido em tempo sequioso
Dali saiu líquido precioso
Pra nossas aurma banhar.


E como as água do Velho Chico,
Irriga, transforma,
Faz nossa vida briá.

Retirarum seu corpo da cruz
Colocarum num túmulo
Num negóço chamado sepucro
O cemitéro deles lá
E nele ficô até guarda a vigiá

Mas num adiantô não
Mermo assim a pedra rolô
Ele resucitô
Ressurgiu dentre os môrto
Se levantô
Êita cabra arretado é Jesus nosso Sinhô.

E hoje, Ele, com essa atitude de amor,
Um candiêro eterno nos dexô
E a chama inapagarvi
De esperança e de amô

Pra andarmo iluminado
Nesse mundo de escuridão:
Levemo intão na mão
(na ação e no o coração)
a luz do nosso Sinhô!